"O ódio anti-negro imprime nas mulheres negras a maior necessidade e compromisso de fazer a luta", afirma professora Andreia Beatriz

03/08/2021

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O mês de julho é especialmente representativo para as lutas de enfrentamento ao racismo engendradas pelas mulheres negras, latinas, caribenhas e africanas. Duas datas importantes marcam o mês denominado Julho das Pretas, que propõe a construção de uma agenda política conjunta entre organizações de todo o país. São elas: o 25 de julho, Dia Internacional da Mulher Afro-Latino Americana e Afro-Caribenha, que tem na figura da Tereza de Benguela a principal representante, e o 31 de julho, como o Dia da Mulher Africana.

 

O desafio colocado para os movimentos no Julho das Pretas é o de dar maior visibilidade às lutas das mulheres negras e construir estratégias de intervenção para o quadro estrutural racista e misógino, fruto de uma sociedade patriarcal e calcada num processo diaspórico forçado que ainda reverbera nas formas de desigualdades e violências, reforçando o papel central das lutas antirracistas na contenção de mazelas que são impostas à população preta e pobre.

 

Para a médica e professora da Uefs, Andreia Beatriz, coordenadora do "Reaja ou Será Morto, Reaja ou Será Morta!", a reflexão colocada pelo mês de julho é fundamental para o reconhecimento do papel social das mulheres negras e para a construção de uma sociedade menos desigual, embora este enfrentamento não possa se resumir apenas a este mês. "As datas servem para que a gente reflita sobre o papel das mulheres para a comunidade negra. Significa dizer que, desde antes, a história do continente africano e de resistência desse país inevitavelmente tem como força motriz a atuação de mulheres negras. Obviamente, algumas ganharam notoriedade, como Tereza de Benguela, mas essa é uma prática que é intrínseca à organização das pessoas negras, à organização das pessoas africanas", afirma.

 

Para Andreia Beatriz, esses momentos são fundamentais para a reorganização das pessoas negras através da compreensão e reconhecimento dos papéis exercidos por estas personalidades que são exaltadas neste período. Estas que são, nas suas palavras, sobretudo, mulheres negras com as mãos calejadas e pés na lama que estavam no fronte para ter como produto final desta luta a libertação do povo negro. 

 

A professora explica que as mulheres negras de forma individual ou coletiva têm se organizado porque sabem que são parte de uma coletividade mais ampla que tem sofrido com todo o processo de brutalização que inferioriza, deprecia e mata mulheres negras, através da negação de direitos e de outras múltiplas violências impostas pela sociedade. "São as mulheres negras que têm sido submetidas às piores condições de emprego, trabalho, remuneração, acesso à educação formal, à saúde e cuidado qualificado na saúde, ocupando postos de trabalho menos organizados e piores remunerados. É toda uma luta que vem de séculos e hoje ainda a gente enfrenta os mesmos problemas. Então, marcar esse mês é na verdade manter a chama acesa do debate do direito à humanidade", diz a docente.

 

Esta luta definitivamente não se inicia e nem termina no mês de julho, é o que a professora Andreia Beatriz faz questão de enfatizar. "Esta luta também serve para demonstrar que as mulheres negras possuem muito tempo de luta; e hoje, no século XXI, a gente ainda tem feito uma luta por libertação, por respeito, por manter a autonomia, uma luta que sobretudo passa ainda pelo debate de humanidade", afirma.

 

A professora utiliza o exemplo das Olímpiadas de Tokyo com a vitória histórica de Rebeca Andrade, prata no individual geral e ouro no salto sobre a mesa da ginástica olímpica, que se tornou a primeira ginasta a receber medalha em jogos olímpicos. Para a professora, são importantes "tanto as vitórias de Rebeca quanto as palavras de Daiane dos Santos, ex-ginasta, campeã mundial na modalidade e também negra, que enfatizou a importância de uma mulher negra conseguir este feito numa sociedade tão perversa para estas mulheres e negros em geral. Segundo Andreia Beatriz, neste mês, a fala de Daiane dos Santos ganha contornos ainda mais importantes. São duas jovens negras que representam tudo aquilo que o Brasil nega enquanto existência e capacidade de desenvolvimento e organização. De certa forma, hoje o que o Brasil mais odeia é o que representa o Brasil no topo do mundo".

 

Para ler mais sobre a perspectiva da professora Andreia Beatriz sobre o Julho das Pretas, a importância da visibilidade e expansão das lutas de mulheres negras não apenas nesse mês, leia o artigo escrito por ela, clicando no link. O título é: Mulheres negras que conhecem, vivem e enfrentam o mundoracista anti-negro que vivemos: mãos calejadas, pés na lama, folhas cobrindo o corpo e amor preto no peito.

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